Saiba quais foram as exigências da Rússia no primeiro encontro com a Ucrânia em dois anos

Após uma hora e 45 minutos de conversas, as delegações de Ucrânia e Rússia encerraram nesta sexta-feira (16) em Istambul o primeiro encontro direto desde 2022 para tentar negociar uma saída para a guerra iniciada com a invasão russa. A informação é da agência estatal turca Anadolu.

Segundo a agência, o encontro — mediado pelo ministro das Relações Exteriores da Turquia, Hakan Fidan — durou menos de duas horas. Já a emissora pública ucraniana Suspilne classificou o resultado como uma “pausa” nas negociações. Não há confirmação sobre uma nova rodada de conversas.

Durante a reunião, Moscou exigiu que a Ucrânia retire suas tropas das quatro regiões ucranianas que foram anexadas pela Rússia durante o conflito — Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporíjia — condição rejeitada veementemente por Kiev. A demanda já havia sido apresentada pelos russos em junho.

As partes também discutiram um possível intercâmbio de mil prisioneiros de guerra de cada lado. Além disso, Moscou afirmou que vai analisar propostas para um cessar-fogo e uma eventual cúpula entre Vladimir Putin e Volodimir Zelensky.

Desde o início da invasão, em fevereiro de 2022, o presidente russo Vladimir Putin mantém posições extremas, exigindo que as causas “profundas” do conflito sejam tratadas, especialmente o interesse ucraniano em aderir à OTAN — organização vista como ameaça existencial por Moscou.

A Rússia reivindica ainda a anexação das quatro regiões parcialmente ocupadas e da península da Crimeia, anexada em 2014. Em março, o chanceler russo Serguei Lavrov afirmou que o “reconhecimento internacional” desses territórios como parte da Rússia é “imperativo” para qualquer resolução.

Putin alega que a ofensiva militar tem como objetivo “proteger” russófonos do leste ucraniano e promover a “desnazificação” do país, que segundo ele estaria sob influência de potências ocidentais hostis. Entre as exigências de Moscou estão também o fim do envio de armas ocidentais e a eliminação de grupos ultranacionalistas ucranianos.

No fim de março, Putin chegou a sugerir a criação de uma “administração transitória” na Ucrânia sob comando da ONU, o que implicaria na saída de Zelensky do poder. Moscou não reconhece a legitimidade do atual presidente ucraniano, alegando que seu mandato de cinco anos expirou em maio de 2024. As eleições, no entanto, foram inviabilizadas pela guerra. Além disso, Putin continua afirmando que a Revolução do Maidan, em 2014, foi um “golpe de Estado” que depôs um presidente pró-Rússia.

Crimeia e garantias de segurança

Para os ucranianos, qualquer concessão territorial é um tema extremamente sensível. Desde 2014, o país sofre perdas humanas e enfrenta grandes esforços econômicos para manter as fronteiras herdadas com a dissolução da União Soviética, em 1991.

Zelensky chegou a mencionar possíveis “trocas” de territórios com a Rússia, referindo-se a áreas da região russa de Kursk sob controle ucraniano. No entanto, essas áreas foram retomadas por Moscou no final de abril.

O principal ponto de conflito continua sendo a Crimeia. Zelensky reafirma publicamente que a península, de maioria russófona e anexada pela Rússia em 2014, é parte integral da Ucrânia, conforme estabelece a Constituição do país.

O presidente ucraniano também cobra de seus aliados “garantias de segurança” para impedir uma nova invasão russa após eventual acordo de paz. A principal demanda de Kiev continua sendo a entrada na OTAN, o que é terminantemente rejeitado por Moscou e descartado pelo ex-presidente dos EUA, Donald Trump.

Como alternativa, Kiev discute com os europeus a criação de uma força militar ocidental que poderia ser mobilizada no país, com apoio da OTAN, caso a paz seja alcançada — proposta rejeitada por Moscou.

Cessar-fogo e pressão internacional

Para dar início a um processo diplomático, Kiev vem pedindo, junto à administração Trump, um cessar-fogo incondicional de 30 dias como etapa inicial para negociações.

Na última semana, aliados europeus dos ucranianos, em coordenação com os Estados Unidos, lançaram um ultimato a Moscou: aceitar uma trégua ou enfrentar sanções severas.

Putin, até agora, resiste à ideia de cessar-fogo, alegando que isso daria tempo para que as forças ucranianas — sob pressão no front — se rearmassem com ajuda ocidental.

No entanto, diante da pressão internacional, o presidente russo propôs nesta quinta-feira (15) as conversas diretas em Istambul, marcando a primeira tentativa concreta de negociação desde a primavera de 2022, quando diálogos anteriores na Bielorrússia e na própria Turquia fracassaram.

Troca de prisioneiros e possível cúpula presidencial

Durante o encontro, os negociadores concordaram com a possibilidade de troca imediata de mil prisioneiros de guerra de cada lado. O anúncio foi feito pelo ministro da Defesa da Ucrânia, Rustem Umérov, chefe da delegação ucraniana. Desde o início da guerra, diversas trocas semelhantes já ocorreram.

Sobre uma possível cúpula entre Putin e Zelensky, o negociador russo Vladimir Medinski afirmou em coletiva transmitida ao vivo pela TV que Moscou “tomou nota da proposta” ucraniana de negociações diretas entre os presidentes e se disse “satisfeito” com o andamento das conversas desta sexta-feira, manifestando “disposição para seguir os contatos”.

Quem participou das negociações

A delegação russa foi liderada por Vladimir Medinski, conselheiro de Putin para assuntos culturais, que também havia chefiado as negociações com Kiev em 2022. Segundo ele, sua nomeação foi determinada diretamente por Putin, e a equipe tem plenos poderes para negociar.

Acompanham Medinski três representantes do alto escalão técnico: um vice-ministro das Relações Exteriores, um vice-ministro da Defesa e um alto oficial do Estado-Maior do Exército russo, Igor Kostyukov. A maioria dos nomes não foi oficialmente divulgada, o que para Kiev demonstra falta de interesse real por parte do Kremlin.

Do lado ucraniano, a comitiva é liderada pelo ministro da Defesa, Rustem Umérov, com representantes das Forças Armadas e dos serviços de inteligência. O presidente Volodimir Zelensky viajou a Ancara para se encontrar com o presidente turco Recep Tayyip Erdogan e demonstrar a importância da reunião.

Também fazem parte da delegação ucraniana o ministro das Relações Exteriores, Andrii Sybiha, e o chefe do gabinete presidencial, Andriy Yermak. Segundo Zelensky, a Ucrânia está disposta a negociar seriamente, diferentemente da postura adotada por Moscou.


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