A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a prisão do deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ganhou novos contornos após a constatação de que o parlamentar deixou o Brasil mesmo tendo seus passaportes cancelados por ordem judicial. O caso levantou preocupação sobre falhas no sistema de bloqueio de documentos diplomáticos e possível risco de fuga.
Ramagem, condenado pela Primeira Turma do STF a 16 anos, um mês e 15 dias de prisão por crimes relacionados aos atos antidemocráticos — entre eles organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado — está em fase de embargos de declaração e ainda não teve condenação definitiva. Mesmo assim, Moraes reforçou que medidas cautelares haviam sido impostas justamente para garantir a efetividade do processo.
Deputado teria viajado pela fronteira terrestre e embarcado para os EUA
Segundo reportagem publicada pelo portal PlatôBR, o deputado está em Miami, nos Estados Unidos, para onde teria viajado após cruzar a fronteira terrestre rumo a um país vizinho. De lá, teria embarcado em um voo comercial utilizando seu passaporte diplomático, que, apesar de cancelado pelo STF, não gerou bloqueio fora do Brasil.
Isso ocorreu porque, diferentemente dos passaportes comuns, cancelados pela Polícia Federal (PF) e automaticamente registrados no sistema internacional SLTD (South Lost Travel Document) da Interpol, os passaportes diplomáticos não passam por comunicação internacional de forma automática. O cancelamento, responsabilidade do Ministério das Relações Exteriores, não é repassado aos órgãos internacionais, o que permite que o documento continue válido em outros países.
Decisão de Moraes reforça necessidade de prisão
A fuga do país, facilitada por essa lacuna operacional, pesou na decisão de Moraes, que determinou a prisão do deputado para evitar novos riscos ao andamento processual. O ministro destacou no acórdão publicado na segunda-feira (17) que todos os réus do núcleo 1 da ação deveriam ter seus passaportes recolhidos exatamente para impedir saídas irregulares.
Mesmo com licença médica desde setembro, Ramagem ainda consta como “em exercício” no sistema da Câmara dos Deputados — e seu passaporte diplomático aparece como válido, apesar de cancelado.
Brecha exposta: passaporte comum x diplomático
Passaporte comum (PF)
- Cancelamento imediato pela PF após decisão judicial
- Informação enviada ao SLTD/Interpol
- Países-membros são automaticamente alertados
Passaporte diplomático (Itamaraty)
- Cancelamento é responsabilidade do Ministério das Relações Exteriores
- Não há notificação automática à Interpol
- Cancelamento pode não ser reconhecido por outros países
Essa diferença permitiu que Ramagem viajasse sem impedimentos, mesmo após determinação expressa do STF.
PF investiga rota de saída
A Polícia Federal apura se o deputado cruzou a fronteira terrestre antes de embarcar para o exterior. Por não haver trânsito em julgado da condenação, Ramagem ainda não é considerado foragido, mas sua conduta é vista como tentativa de driblar medidas judiciais impostas pela Corte.
Prisão reacende debate sobre controle de passaportes diplomáticos
A saída do parlamentar expôs uma fragilidade no sistema de cancelamento desses documentos e levantou questionamentos sobre a necessidade de padronizar a comunicação internacional, especialmente em casos envolvendo decisões do STF e réus que respondem por crimes graves.
Com a determinação de prisão, o STF tenta garantir que Ramagem responda ao processo dentro do país, enquanto autoridades discutem possíveis ajustes nos protocolos para impedir novas brechas semelhantes no futuro.