O governo do Paraguai anunciou, nesta terça-feira (1º), medidas enérgicas em resposta a uma denúncia de espionagem conduzida pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) contra autoridades paraguaias. O país vizinho convocou seu embaixador no Brasil, Juan Ángel Delgadillo, e suspendeu as negociações sobre o estratégico tratado da usina hidrelétrica de Itaipu.
A decisão foi comunicada pelo ministro das Relações Exteriores do Paraguai, Rubén Ramírez Lezcano, em um claro sinal de crescente descontentamento diplomático. O objetivo é pressionar o Brasil a fornecer explicações detalhadas sobre a suposta operação de espionagem.
A revelação, divulgada inicialmente pelo portal UOL, indica que a Abin teria realizado uma ação hacker para obter informações confidenciais relacionadas à renegociação do Anexo C do tratado de Itaipu, cláusula crucial que define a comercialização de energia entre os dois países.
Segundo depoimentos de servidores da Abin à Polícia Federal, a ação de espionagem teria sido planejada no final do governo de Jair Bolsonaro (PL) e executada durante a atual gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em nota divulgada na segunda-feira (31), o Ministério das Relações Exteriores do Brasil (Itamaraty) confirmou que a operação foi iniciada na gestão anterior, mas afirmou que o governo Lula encerrou a ação em março de 2023, assim que tomou conhecimento dos detalhes.
Inicialmente, o chanceler paraguaio havia declarado que o país não havia detectado indícios de invasão em seus sistemas. No entanto, a postura mudou após a confirmação oficial brasileira da existência da espionagem. “Essa é uma violação do direito internacional, uma intromissão nos assuntos internos por parte de um país sobre outro”, enfatizou Ramírez em coletiva de imprensa.
Em resposta direta à confirmação da espionagem, o Paraguai suspendeu por tempo indeterminado as negociações sobre o Anexo C do tratado de Itaipu, um acordo de vital importância para ambos os países. Além disso, o governo paraguaio anunciou a abertura de uma investigação interna para apurar a extensão da possível invasão e captura de dados por parte do Brasil.
Ramírez Lezcano informou ainda que o governo paraguaio solicitará explicações formais ao embaixador brasileiro no Paraguai sobre os detalhes da operação conduzida pela Abin.
A notícia da espionagem gerou forte repercussão política em Brasília. A operação hacker teria utilizado ferramentas sofisticadas, como o software Cobalt Strike, com agentes da Abin realizando viagens ao Chile e Panamá para tentar ocultar a origem dos ataques.
De acordo com fontes ligadas à investigação da Polícia Federal, os alvos da espionagem incluíam autoridades do Congresso, do Executivo e do setor energético paraguaio. Acredita-se que as informações foram capturadas meses antes da assinatura do novo acordo sobre tarifas de energia de Itaipu, firmado em maio de 2024.
Em paralelo a essas revelações, a Polícia Federal (PF) abriu um novo inquérito nesta terça-feira (1º) para investigar um possível vazamento de informações do inquérito da chamada “Abin paralela”. Essa investigação já apura a existência de uma estrutura ilegal dentro da Agência Brasileira de Inteligência, com indícios de que servidores cedidos utilizaram ferramentas e serviços da agência para práticas ilícitas durante o governo anterior.
A abertura deste novo inquérito sobre o vazamento ocorre justamente após a divulgação da operação hacker contra o governo paraguaio, confirmada por um depoimento de um servidor da Abin à PF e noticiada pelo portal UOL. Segundo os depoimentos, o programa Cobalt Strike foi utilizado para invadir dispositivos do governo paraguaio, com o objetivo de obter dados cruciais para a negociação da Usina Hidrelétrica de Itaipu, incluindo os valores negociados para a venda de energia gerada pela binacional.
Espionagem: Paraguai convoca embaixador brasileiro e trava negociações do acordo de Itaipu
