O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou nesta terça-feira (3) que sua saúde é fundamental para impedir o “retorno da extrema-direita” ao poder em 2026. A afirmação foi feita em entrevista ao jornal Le Monde, publicada às vésperas de sua visita de Estado à França, marcada para 5 de junho.
“Quero viver até os 120 anos! Sobre 2026, só posso garantir uma coisa: não permitirei o retorno da extrema-direita ao poder. O remédio para a crise não é menos democracia — é mais democracia”, disse Lula.
Sobre a queda em sua avaliação de popularidade, o presidente reconheceu: “Sim, minha popularidade não é mais a de antes… Mas nas pesquisas para a próxima eleição, sigo na liderança”. Apesar do crescimento do PIB de 3,4% em 2024 e da queda no desemprego, Lula afirmou que tem sido difícil convencer os eleitores dos benefícios produzidos pelo governo e culpou as redes sociais pelo “ambiente de agressividade e de recusa ao diálogo” que elas suscitam, especialmente entre a oposição.
Questionado sobre uma suposta contradição entre seu discurso ambientalista e o apoio à exploração de petróleo na Margem Equatorial, na foz do Rio Amazonas, Lula negou. “O Brasil não vai abrir mão de uma riqueza essencial para seu desenvolvimento. Que país hoje pode prescindir do petróleo? Nenhum pode se livrar disso tão rápido”, argumentou. Ele acrescentou: “E, no nosso caso, é justamente o dinheiro do petróleo que financiará nossa transição energética. Portanto, não há contradição”. O presidente destacou a expertise da Petrobras em prospecção em águas profundas e a ausência de incidentes graves, ressaltando que o poço será perfurado a 500 km do delta do Amazonas. “Não haverá problema. E, se houvesse risco, eu seria o primeiro a me opor”, garantiu. O projeto tem sido alvo de críticas de ambientalistas e lideranças indígenas, que veem uma contradição com o discurso do governo, especialmente no ano em que o Brasil sediará a COP30.
Lula se mostrou otimista com a COP30, que será realizada em Belém do Pará em novembro, e disse acreditar que o presidente dos EUA, Donald Trump, deverá comparecer. Sobre a pauta climática, o presidente brasileiro defendeu: “Para nós, o ponto central é o financiamento da luta contra as mudanças climáticas. Os países ricos, que tiveram dois séculos de industrialização à base de gases do efeito estufa, têm uma dívida histórica com o clima — e devem pagá-la”.
Em relação a Trump, Lula declarou que ele “foi eleito para governar os EUA, não o mundo” e que isso não lhe dá autoridade para “se intrometer” em outros países ou “desrespeitar sua soberania”. Sobre tarifas recíprocas, reafirmou a prioridade do diálogo, mas sem descartar medidas retaliatórias: “Quero que usemos todas as palavras do dicionário da negociação. Mas, se isso não funcionar, estamos prontos para aplicar medidas de reciprocidade tarifária”.
Referindo-se à sua visita a Moscou em 9 de maio para o Dia da Vitória, Lula não viu problemas em ter ido, apesar do mandado de prisão do TPI contra Putin. “Fui a Moscou para homenagear os 80 anos da vitória sobre o nazismo, por respeito a um país que perdeu 26 milhões de vidas nessa guerra. Um país, aliás, com o qual o Brasil mantém sólidas relações comerciais”, afirmou.
Sobre Gaza, o presidente foi enfático: “não se trata de um confronto entre exércitos, mas de um massacre de civis por uma força militar altamente sofisticada. Para mim, isso é genocídio. Cada ataque de Israel, supostamente contra o Hamas, só deixa para trás vítimas civis – mulheres e crianças”. Ele voltou a sublinhar a importância dos órgãos multilaterais e do reconhecimento do Estado palestino por mais países. “A ONU precisa retomar seu papel de mediadora, pois hoje suas decisões são ignoradas, e a organização está paralisada. Precisamos mais do que nunca de uma governança global”, disse.
Questionado se a cúpula do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) representa uma resposta do Sul Global a Washington, Lula declarou que não se trata de “estar a favor ou contra” Trump. “O objetivo do Sul Global é crescimento e desenvolvimento. O Brics não tem inimigos, e não quer ter”, disse. “O Brasil quer manter boas relações com a China e com os EUA”. O presidente, no entanto, ressaltou que o contexto em que os países do Sul eram tratados como nações em desenvolvimento que “não incomodavam ninguém” acabou. Segundo Lula, “isso acabou. O Brics hoje representa 39% do PIB mundial e mais da metade da população do planeta”. Sobre a ameaça de Trump de aplicar tarifas de 100% a países que tentem abandonar o dólar, o petista disse que “não assusta ninguém”. Ele acrescentou que as ações do bloco visam aos interesses dos países e a um comércio internacional mais justo. “Não é fácil, claro. Mas não vamos pedir autorização a Washington para escolher a moeda que julgarmos mais apropriada para nossos intercâmbios”, declarou o petista.