O exército brasileiro anunciou nesta segunda-feira que a empresa israelense Elbit Systems, e suas subsidiárias brasileiras Ares Aeroespacial e Defesa e AEL Sistema, venceu a licitação internacional da Força Terrestre para adquirir 36 viaturas blindadas de combate, conhecidas como obuseiros de calibre 155 mm autopropulsados sobre rodas (VBCOAP-SR). A escolha deve criar novo atrito entre a Força Terrestre, o Partido dos Trabalhadores (PT) e integrantes do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Para além das disputas entre os dois governos, as Forças Armadas e as polícias do Brasil mantêm uma relação antiga com empresas de Israel. A Marinha, por exemplo, depende dos israelenses para a manutenção das turbinas de seus caças A4 Skyhawk, baseados no Rio. Polícias brasileiras compraram armas e até mesmo material de espionagem de empresas de Israel. O Exército fechou a compra recente de mísseis anticarro Spike LR, da israelense Rafael, cuja entrega está atrasada em razão da guerra.
Este é o primeiro senão ao produto da Elbit, o sistema Atmos 2000, vencedor da licitação para o VBCOAP. Trata-se de uma licitação milionária, cujos valores podem chegar perto de R$ 1 bilhão. Os outros três concorrentes eram a empresa Nexter francesa, com seu sistema Caesar, o SH-15 da chinesa Norinco e o viaturas do sistema eslovaco Zuzana, cujo fabricante firmara uma parceria com a brasileira Avibrás, cujos milhões do novo contrato poderiam ajudar a retirar a empresa da recuperação judicial.
No caso do sistema israelense, haveria dúvidas sobre a capacidade da empresa respeitar os prazos de entrega previstos pelo Exército em razão da imprevisibilidade de uma escalada no conflito no Oriente Médio. O mesmo problema afetaria os concorrentes europeus, cujos países estão comprometidos em apoiar a Ucrânia na guerra com a Rússia. As 36 novas viaturas VBCOAP vão equipar as unidades de artilharia divisionária do Exército.
A esquerda petista se articula para pressionar o governo Lula contra a possibilidade de a Força Terrestre fechar a compra do equipamento israelense. Petistas históricos, como José Genoino, consideram que adquirir o produto da Elbit System seria financiar indiretamente o esforço de guerra de Israel. Genoino alertou em março que isso traria um enorme desconforto para a base social do governo, que não entenderia a medida, ainda mais diante do atual nível de confrontação com a administração Netanyahu. Não só a esquerda do partido é contra. Na semana passada, o vice-presidente da sigla, o deputado federal Washington Quaquá, também se manifestou contra o negócio com Israel.
Não era segredo para o Exército a animosidade do governo em relação à atual administração de Israel. mesmo assim decidiu seguir adiante com “sua escolha técnica”. No ano passado, a Força Terrestre defendeu a venda de 400 unidades do blindado Guarani em versão ambulância para a Ucrânia, mas a operação de R$ 3,5 bilhões recebeu parecer contrário do Ministério das Relações Exteriores e foi vetada pelo presidente Lula. Agora, a Força mais uma vez leva o problema à mesa do presidente a fim de que ele decida.
É possível que critérios geopolíticos prevaleçam no caso, pois as compras da Defesa têm regras próprias. A compra das viaturas blindadas de obuseiros autopropulsados pelo Exército tem diante de si também o desafio do surgimento de novas prioridades, como a artilharia antiaérea de médio alcance. Por fim, a Força Terrestre começa a trabalhar com um cenário de restrição orçamentária cujo fim ainda não é previsível.