O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes afirmou à Reuters que tribunais brasileiros podem punir instituições financeiras nacionais que bloquearem ou confiscarem ativos domésticos em resposta a ordens norte-americanas. As declarações foram dadas em meio a um impasse que provocou queda nas ações de bancos brasileiros, que ficaram pressionados entre sanções dos EUA e decisões do STF.
Em entrevista na noite de terça-feira, em seu gabinete em Brasília, Moraes reconheceu que a atuação da Justiça dos EUA sobre bancos brasileiros “é da aplicação da lei norte-americana”.
“Agora, da mesma forma, se os bancos resolverem aplicar a lei internamente, eles não podem. E aí eles podem ser penalizados internamente”, afirmou.
O ministro se referiu à decisão de Flávio Dino, também do STF, que determinou na segunda-feira que leis estrangeiras não podem ser automaticamente aplicadas no Brasil. A medida provocou reação do Departamento de Estado dos EUA, que classificou Moraes como “tóxico” e alertou que “pessoas que não são dos EUA devem ter cautela: aquelas que fornecerem apoio material a violadores de direitos humanos correm o risco de também serem sancionadas”.
O Departamento do Tesouro norte-americano sancionou Moraes no mês passado com base na Lei Magnitsky, alegando que ele teria “suprimido a liberdade de expressão e liderado processos politizados”, incluindo investigações contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, que nega qualquer crime.
Segundo Moraes, decisões de tribunais e governos estrangeiros só podem ter efeito no Brasil após validação por trâmites legais internos. “Portanto, não é possível confiscar bens, congelar fundos ou bloquear propriedades de cidadãos brasileiros sem seguir esses trâmites legais”, disse o ministro.
Ele alertou que o alcance global do sistema financeiro dos EUA coloca bancos estrangeiros em uma posição delicada, forçando restrições para evitar sanções secundárias. Sobre a aplicação da Lei Magnitsky contra ele, Moraes declarou que foi “totalmente equivocado”, mas se mostrou confiante na reversão das sanções por meio de canais diplomáticos ou tribunais norte-americanos.
“Esse desvio de finalidade na aplicação da lei coloca até instituições financeiras em uma situação difícil. E não são só instituições financeiras brasileiras, mas são seus parceiros norte-americanos, são empresas norte-americanas que atuam no Brasil e também têm contas, investimentos, financiamentos de bancos brasileiros”, explicou.
O ministro reforçou a importância de resolver a situação diplomaticamente: “Exatamente por isso que é importante, eu repito, o canal diplomático para que isso seja logo solucionado para não desvirtuar a aplicação de uma lei que é importante contra o terrorismo, contra organizações criminosas, contra o tráfico internacional de drogas, contra o tráfico internacional de seres humanos”.
O impasse entre Brasil e EUA também preocupa o setor bancário. Segundo banqueiros ouvidos sob anonimato, a decisão do STF significa que qualquer ação tomada por bancos brasileiros em cumprimento às sanções do Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC) precisará de autorização do Supremo. Ao mesmo tempo, deixar de cumprir uma decisão do OFAC pode limitar o acesso dos bancos ao sistema financeiro internacional.
“O Brasil realmente não tem escolha”, disse um banqueiro. “Dado o quão interconectado tudo é, e a disparidade de poder econômico entre os EUA e o Brasil, ficamos em uma posição de subordinação. Não há muito o que fazer.”
Na terça-feira, ações do Banco do Brasil caíram 6%, a maior queda entre os três maiores bancos do país. Em nota, a instituição afirmou estar preparada para lidar com questões “complexas e sensíveis” envolvendo regulamentações globais.