Supremo Tribunal Federal (STF) volta nesta quarta-feira, 4, a julgar um caso que pode remodelar as normas sobre redes sociais no Brasil. O tribunal avança sobre um campo que pertence ao Congresso e abre espaço para um controle mais rígido da comunicação digital.
A sessão recomeça com o voto do ministro André Mendonça. Em dezembro de 2023, ele havia pedido vista do processo. O julgamento discute a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que atualmente impede que plataformas sejam responsabilizadas por conteúdo de terceiros sem ordem judicial.
Juristas têm reiterado que legislar não é atribuição do Judiciário. Derrubar o Marco Civil ou criar novas regras para a internet excede as competências da Corte. Apesar disso, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, já sinalizou outra direção. Recentemente afirmou: “O STF esperou por muitos anos a aprovação de legislação pelo Congresso. A lei não veio, mas nós temos casos para julgar”.
Especialistas em liberdade de expressão questionam essa argumentação. O advogado André Marsiglia, por exemplo, destaca que o Congresso decidiu de forma legítima não avançar com o PL 2630/2020, conhecido como PL das Fake News.
“O STF não esperou nada porque o Congresso decidiu, e a decisão foi não regular”, destacou Masiglia no X. “Decisão legítima e desrespeitada pelo STF.”
A tendência do julgamento indica um cenário em que redes sociais adotem censura preventiva. Plataformas podem passar a remover conteúdos por receio de punições financeiras. Fábio Coelho, presidente do Google no Brasil, alertou em entrevista recente: “As plataformas vão ter que preventivamente remover qualquer conteúdo que seja potencialmente questionável para evitar uma responsabilização ou um passivo financeiro.”
O contexto se agrava com a proximidade das eleições de 2026
O contexto se agrava com a proximidade das eleições de 2026. A liberdade de expressão nas redes poderá ficar mais restrita do que em 2022, quando já se observou uma onda crescente de censura prévia.
A exigência de atuação proativa pressionaria as empresas a adotar algoritmos para rastrear e excluir conteúdos. Embora essas ferramentas sejam comuns em casos de pornografia infantil ou apologia ao terrorismo, seu uso em temas subjetivos, como “discurso de ódio”, aumenta o risco de remoções arbitrárias.
Entre os principais receios está a exclusão de críticas a autoridades e personalidades públicas, com critérios pouco claros. Enquanto isso, ministros do STF apresentam a medida como um avanço.
O voto de André Mendonça deve defender a manutenção da exigência de ordem judicial para remoção de conteúdos
O voto de André Mendonça deve defender a manutenção da exigência de ordem judicial para remoção de conteúdos. Ele pretende preservar o texto atual do artigo 19. No entanto, a tendência é que seu voto fique isolado. Três ministros já se manifestaram por declarar, ao menos parcialmente, a inconstitucionalidade do dispositivo.
Dias Toffoli abriu os votos. Para casos de desinformação que afete eleições ou grupos vulneráveis, sugeriu que a simples notificação da parte ofendida possa gerar responsabilização das plataformas, sem necessidade de ordem judicial.
Luiz Fux votou em seguida. Para conteúdos graves, como discurso de ódio, pedofilia ou apologia ao golpe, propôs o “dever de cuidado”, em que as plataformas seriam obrigadas a excluir o material imediatamente. Para crimes contra a honra, como calúnia e difamação, defendeu que uma notificação bastaria para exigir a retirada.
Luís Roberto Barroso apresentou uma solução intermediária. Defendeu que o artigo 19 é parcialmente inconstitucional, mas deve ser preservado para crimes contra a honra. Em outros casos, como terrorismo e incitação ao suicídio, propôs a aplicação do dever de cuidado.
STF caminha para assumir um papel inédito em democracias: regular diretamente o funcionamento das rede
Independentemente do desfecho, o STF caminha para assumir um papel inédito em democracias: regular diretamente o funcionamento das redes. Em outros países, mesmo regimes autoritários submeteram a regulação das plataformas ao Legislativo ou ao Executivo.